Parem de colar cartazes!

No final da década de 90 (século passado, para os mais jovens), em um dos primeiros projetos que participei como consultor, num trabalho de Cultura Organizacional, uma pessoa entrou na sala de reuniões com o CEO e seu time de alta direção para colar cartazes sobre os valores, crenças, missão e visão do negócio.

Foi a primeira vez, acredito, que pensei: “Que coisa inútil! Ninguém vai prestar atenção nisso, pois enquanto esses cartazes são colados, as pessoas estão vivendo seus problemas reais e imediatos, se protegendo e tentando sobreviver por aqui.”

Hoje, depois de décadas, confirmo meu pensamento inicial e posso afirmar que poucas empresas articulam sua cultura corporativa de forma que as palavras se tornem uma realidade organizacional, orientando o comportamento dos funcionários e garantindo o desdobramento da estratégia com razoável coerência.

Compartilho algumas dicas para pensarmos juntos:

Dica 1: Foque nos dilemas reais

O caminho para dar vida a uma cultura desejada é debatê-la e articulá-la a partir de dilemas reais das pessoas e do negócio. Se você identificar os dilemas difíceis que seus funcionários enfrentam rotineiramente e indicar claramente como devem ser resolvidos — “Nesta empresa, quando nos deparamos com esse dilema, fazemos isso, viramos à direita, pensamos assim ou assado” — a cultura desejada se enraizará e influenciará o comportamento da equipe.

Recomendo que os líderes prestem bastante atenção sobre como as equipes estão resolvendo os problemas externos, de competitividade no mercado e, ao mesmo tempo, como estão se fortalecendo e criando uma coesão interna.

Somos animais sociais, ou seja, nossas necessidades afetivas e racionais moldarão a cultura enquanto estivermos debatendo e resolvendo dilemas comuns a todos.

Dica 2: Trate a Cultura como algo vivo

Não existe cultura boa ou ruim.

Se a sua empresa persegue o desenvolvimento da cultura pensando em modelos prontos, considerados “de sucesso” no mercado, ou olhando a grama do vizinho, posso garantir: está ferrada.

Uma cultura saudável se transforma à medida que as pessoas compreendem e lidam com as pressões do mercado por competitividade e com suas próprias necessidades. Ninguém pode pensar em “consertar” a cultura, pois ela é aprendida enquanto as pessoas se posicionam, convivem, trabalham e entregam resultados juntas. A cultura jamais estará totalmente “pronta” ou “estabilizada”, ou seja, requer atenção diária.

Se, por exemplo, você busca passar de uma cultura de eliminação de erros, consistência e replicabilidade (popular durante a era industrial) para uma cultura de adaptabilidade, inovação e capacitação (cada vez mais necessária na era digital), precisará estimular a confrontação de ideias, redesenhar processos, adotar novas tecnologias e questionar velhas práticas de liderança e gestão de pessoas.

Dica 3: Use grandes imagens, grandes histórias e rituais consistentes

Ensine seus líderes a compartilharem a visão usando grandes imagens, histórias envolventes e por meio de rituais consistentes.

Uma cultura forte está a serviço da estratégia quando consegue um bom nível de coerência no chamado Ciclo de Gente — ou seja, quando atrai, contrata, integra, desenvolve, avalia, remunera, impacta a carreira, orienta a sucessão e demite intencionalmente.

Essa busca por coerência aumentará as chances de que a visão compartilhada, a estratégia, os objetivos estratégicos, indicadores, metas, rotinas e projetos sejam melhor compreendidos e executados.

Peter Senge nos ensinou que “uma visão compartilhada não é uma ideia. É uma força no coração das pessoas. (…) As pessoas começam a vê-la como se já existisse”.

Seja você CEO, VP, diretor, gerente ou qualquer outra liderança na empresa, pare de colar cartazes e defina o caminho por práticas genuínas e flexíveis.

Lembre-se: as pessoas são inteligentes, e você não pode correr o risco de virar um meme (para os mais velhos, é uma mensagem quase sempre em tom jocoso ou irônico que pode ou não ser acompanhada por uma imagem ou vídeo e que é intensamente compartilhada em mídias sociais ou em algum grupo de WhatsApp do qual o chefe não participa).

 

Alcir Miguel

Sócio e executivo de negócios na Movidaria.

Share with

Leave a Reply

Start typing and press Enter to search