Seja inteiro ou não seja nada em um ambiente multigeracional

Atualmente, nas grandes empresas convivem quatro — na maioria dos casos — gerações sob o mesmo teto corporativo.

Temos os Baby Boomers, que cresceram em um mundo de hierarquias bem definidas e valorizam estabilidade. A Geração X, marcada por um espírito de independência, pragmatismo e valorização do mérito (mesmo que saibamos que ele não existe como sonhamos – leia meu artigo Caviar.

Os Millennials, movidos por propósito, reconhecimento e equilíbrio entre vida pessoal e profissional. E, mais recentemente, a Geração Z, nativa digital, hiperconectada, ágil e com alto senso crítico sobre o mundo ao seu redor.

Esse encontro de gerações traz desafios reais para os líderes. O que inspira um colaborador de 55 anos pode ser irrelevante — ou até contraproducente — para um profissional de 23.

Tentar agradar a todos com discursos moldados a cada grupo só aumenta o ruído e mina a confiança. Há uma linha tênue entre adaptação e incoerência. Entre empatia e perda de identidade.

É aqui que entra o papel da integridade como bússola da liderança. Em um ambiente onde os valores são múltiplos e as perspectivas diversas, a integridade oferece algo raríssimo: coerência.

Integridade não é rigidez. Não é impor uma única visão de mundo. É alinhar discurso e prática, mesmo diante da complexidade.

É ter clareza de valores e usá-los como referência para tomar decisões — especialmente quando essas decisões não agradam a todos. É respeitar cada geração em sua singularidade, sem perder a coerência do conjunto.

Um líder íntegro não tenta ser um camaleão. Ele não muda de cor para agradar a plateia. Ele se posiciona com clareza, ouve com humildade e age com consistência. E isso, mais do que qualquer técnica de engajamento geracional, é o que constrói confiança entre diferentes faixas etárias.

A Geração Z, por exemplo, é altamente sensível à incoerência. Cresceram vendo discursos vazios sendo desmascarados nas redes sociais. Com eles, não adianta prometer “autonomia” e depois microgerenciar cada tarefa.

Não adianta defender “diversidade” e manter um board homogêneo. Eles enxergam as contradições — e se afastam rapidamente.

Os Millennials, que buscaram propósito no trabalho, sentem-se profundamente desmotivados quando percebem que esse “propósito” é apenas marketing. Integridade, nesse contexto, significa praticar o que se prega — e estar disposto a corrigir rotas quando se erra.

A Geração X, por sua vez, cresceu valorizando meritocracia, esforço e estabilidade. Para conquistá-los, a liderança precisa mostrar que há justiça nas decisões. Integridade, aqui, se traduz em transparência, clareza de critérios e imparcialidade.

E os Boomers? Para eles, a integridade do líder se revela na lealdade, na responsabilidade e na disposição de enfrentar crises sem se esconder. Eles valorizam quem assume o peso das decisões, mesmo as impopulares. Querem ver resiliência, respeito à história e coerência ao longo do tempo.

Pesquisas indicam que a integridade do líder está diretamente associada à coragem e confiança da equipe, especialmente em contextos diversos e complexos.

Um estudo publicado na Journal of Leadership & Organizational Studies mostra que a integridade percebida do líder é um dos fatores mais fortes na construção de confiança intergeracional no ambiente de trabalho – (Simons, T., Friedman, R., Liu, L. A., & McLean Parks, J. (2007); Racial Differences in Sensitivity to Behavioral Integrity: Attitudinal Consequences, In-Group Effects, and “Trickle Down” Among Black and Non-Black Employees. JLOS, 14(3), 248–259).

Isso reforça a ideia de que, mais do que tentar adotar as linguagens de cada geração, os líderes precisam ser previsíveis em seus valores, coerentes em suas atitudes e claros em seus limites.

Quando a equipe sabe o que esperar — mesmo que não concorde — ela respeita. E com respeito, há espaço para as conversas corajosas. E com diálogo, há maturidade.

Três dicas práticas para líderes desenvolverem a integridade no ambiente multigeracional:

  1. Declare seus princípios e atue sobre eles, mesmo sob pressão Toda equipe precisa saber quais valores são inegociáveis para a liderança. Escreva, compartilhe e, principalmente, viva esses valores. Quando surgir um dilema, escolha o caminho coerente — mesmo que ele seja mais difícil ou impopular.
  2. Peça feedback de todas as gerações e pratique escuta ativa Integridade também se demonstra na disposição de ouvir. Crie espaços corajosos para que todas as vozes possam se manifestar — dos estagiários aos mais antigos. Mas atenção: escutar não é concordar com tudo, e sim considerar com respeito.
  3. Seja transparente sobre decisões e explique os porquês Quando uma ação impacta diferentes gerações de forma distinta, explique sua lógica de maneira clara e empática. A transparência é a ponte entre o respeito e a aceitação. E um líder íntegro não se esconde atrás de e-mails frios nem terceiriza o ônus de suas escolhas.

Em tempos de diversidade geracional, a liderança baseada em integridade é menos sobre ter respostas certas e mais sobre fazer as perguntas certas com coragem e coerência.

As gerações continuarão mudando. A tecnologia também. Mas os líderes que resistem ao tempo são aqueles que não negociam sua essência.

 

Alcir Miguel

Sócio e executivo de negócios na Movidaria.

Share with

Leave a Reply

Start typing and press Enter to search